quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

No bloco da saúde mental


Sônia Paiva
Professora de Enfermagem em Saúde Mental e Psiquiatria da FMP/Fase

O início do ano serve como convite à reflexão sobre nossa saúde mental e o quanto negligenciamos o próprio bem-estar, na batalha diária pela sobrevivência. Com tantas notícias sobre violência, nos bairros e no trânsito, e novos casos de febre amarela, parece bobagem falar de problemas pessoais. Mas, se pararmos para pensar, veremos que, quando a cabeça não vai bem, tudo tende a ficar mais difícil.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu, em 1948, saúde como completo bem-estar físico, mental e social e não somente a ausência de doença. Apesar de parecer um conceito utópico, nos dias atuais constatamos a falta de saúde por termos talvez negligenciado este conceito, dando durante muitos anos ênfase às doenças do corpo. Na ótica da doença, o campo da psiquiatria por muitos anos se limitou às patologias, isolando para tratamento, surgindo os manicômios, onde o isolamento, a exclusão social e alienação perpetuaram por muitos anos.

No início da década de 90, com a Declaração de Caracas, marco dos processos de reforma da assistência em Saúde Mental nas Américas, vinculou-se a atenção psiquiátrica à atenção primária em saúde. No Brasil, em 1992 foram normatizadas as ações de saúde mental, definindo as normas para o atendimento ambulatorial e hospitalar.

A Lei 10.216/01, marco legal da Reforma Psiquiátrica Brasileira, garante à população assistência integral nos serviços públicos de saúde sem qualquer tipo de exclusão. No vácuo de propostas concretas de bases territoriais, somente em 2002 se estabelece a construção de novos serviços públicos de saúde mental, elegendo os Centros de Atenção Psicossociais (Caps) como o dispositivo para atendimento às pessoas em sofrimento psíquico, tendo ainda como atribuições as ações de prevenção e promoção em saúde mental.

Falar sobre saúde mental é prevenir o surgimento de doenças mentais, minimizar o  sofrimento humano, dentre eles o dano causado pelo preconceito e exclusão. É preciso debater o assunto, ouvir com atenção os pacientes, e especialistas e ter gestores comprometidos com a causa. Só assim poderemos definir onde nossos serviços públicos de saúde estão falhando. Defender o que pode ser melhorado, além do maior acesso da população a serviços de qualidade, é um dever de todos: cidadãos, profissionais de saúde e gestores. Só assim estaremos contribuindo efetivamente para um Sistema de Saúde equânime, integral e universal.

Infelizmente, ainda é cruel a realidade vivida pela saúde mental. A OMS estima que até 2020 75% da população brasileira sofrerá algum tipo de transtorno mental. Os serviços estão ameaçados por conta de falta de equipamentos, com profissionais tendo sobrecarga de trabalho por conta do déficit de dimensionamento. Aumenta a cada dia a demanda de usuários que necessitam de atendimento. Falta de insumos e medicamentos afetam não somente os pacientes, mas todos os profissionais comprometidos com a melhoria da qualidade de vida da população. A falta de repasse de recursos e a atual gestão do Ministério da Saúde tem abalado severamente o futuro da assistência de saúde mental. É preciso não se conformar, dizer não à exclusão e gritar, manicômios nunca mais!    

Como o carnaval está chegando, vale prestar atenção ao recado de um bloco carnavalesco original: o Tá Pirando, Pirado, Pirou! O bloco foi fundado em dezembro de 2004, no Instituto Municipal Philippe Pinel com base na premissa de um folião: “Não vamos fazer carnaval só para quem está aqui dentro, e já pirou, vamos para rua brincar com quem tá pirando...Tá pirado, pirou!”.

O décimo quarto desfile do grupo, no dia 4, na Urca, no Rio, lembrará que, em 2017, comemoramos 30 anos do Movimento Nacional da Luta Antimanicomial. Defenderá a reforma psiquiátrica e o SUS dos ataques que sofre, bem como os Centros de Atenção Psicossocial (Caps). Vale registrar que, por falta de recursos, há Caps ameaçados de fechamento.

“Nenhum passo atrás, nenhum serviço de saúde a menos, manicômio nunca mais! Que a força da imaginação de Dona Ivone Lara esteja conosco e nos inspire nesta luta”, diz o manifesto do bloco, cujo enredo será “Foram me chamar! Eu estou aqui, na luta, na lida, no samba. Salve Dona Ivone Lara!” Para quem não sabe, a primeira-dama do samba, de 96 anos, se formou enfermeira, pela Faculdade de Enfermagem do Rio de Janeiro, atual Unirio, e depois em assistente social, com especialização em terapia ocupacional, atuando na saúde mental.

Durante 38 anos, ela trabalhou no antigo Centro Psiquiátrico Pedro II até se aposentar, em 1977. Em 2011 foi homenageada na Assembleia Legislativa como madrinha da Enfermagem, contando com a participação do Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro (Coren-RJ). Na ocasião, relembrou que, na década de 40, a Enfermagem abandonou a unidade em sinal de protesto contra as condições de trabalho e os salários, mas que percebeu que os únicos prejudicados seriam os doentes. Assim retornaram ao trabalho, foram punidos e tiveram descontados os dias que ficaram parados. Dona Ivone integrou a equipe de monitores da Dra. Nise da Silveira. Promovia oficinas de música e buscava localizar familiares dos internos para tentar restabelecer laços familiares.

Sem dúvida, é uma merecedora de tantas homenagens e um bom exemplo para os futuros profissionais. Diversas instituições de ensino de Enfermagem a têm como musa inspiradora. Na Faculdade de Enfermagem Arthur Sá Earp Neto (FMP/Fase), em Petrópolis, formamos enfermeiros comprometidos com a saúde mental, despertando nos alunos a visão crítica e construtiva para atuarem com criatividade desde a prevenção até a reabilitação, livres de exclusão, pautados na ética, conhecimento científico e solidariedade. Os alunos também desenvolvem ações de promoção em saúde nas escolas. Podemos dizer que estamos aqui na luta e que somos pirados pela saúde mental!   

 

Residência em Enfermagem Obstétrica vai reforçar Rede Cegonha


A partir de 1 de março, o sistema de saúde de Petrópolis ganhará o reforço de mais dois profissionais dedicados ao parto seguro, reforçando a Rede Cegonha. É que a Faculdade Arthur Sá Earp Neto (FMP/Fase) abriu inscrições para a Residência em Enfermagem Obstétrica, com prova agendada para 25 de fevereiro. A Rede Cegonha é uma estratégia do Ministério da Saúde que busca um novo modelo de cuidado com a saúde da mulher e da criança, com foco na atenção ao parto e ao desenvolvimento do recém-nascido até este completar dois anos.

"A residência torna-se relevante pela escassez de enfermeiros especializados no município e pela possibilidade de melhoria do atendimento ao nascimento, considerando que o enfermeiro especializado em obstetrícia é um profissional competente para auxiliar no cumprimento dos objetivos da Rede Cegonha. A residência também contribuirá como facilitadora ao acesso de enfermeiros petropolitanos à especialização na área", diz a coordenadora do Programa de Residência em Enfermagem Obstétrica da FMP/Fase, a enfermeira Leila Schmidt Bechtlufft.

Segundo Leila, os egressos do curso de graduação em Enfermagem que desejam aprofundar os conhecimentos em especializações são obrigados a buscar a formação em outro município. "Isso pode inviabilizar a especialização para alguns, já que a mudança de domicílio muitas das vezes não é possível. E também pode afastar os profissionais da cidade, considerando que acabam por consolidar vínculos nos locais onde se especializam", explica a coordenadora.

A professora da FMP/Fase ressalta que a atuação dos enfermeiros na assistência pré-natal em Petrópolis é marcante, oferecendo assistência à gestante em todas as Unidades Básicas de Saúde, independentemente da presença do profissional médico na equipe, conforme comprovou pesquisa do PET-Saúde III (Ministérios da Saúde e Educação) citada por ela.

"A única maternidade que atende usuárias do Sistema Único de Saúde está no Hospital de Ensino Alcides Carneiro. Em novembro de 2015, a região serrana recebeu recursos financeiros para qualificar para a Rede Cegonha os serviços das maternidades de Nova Friburgo e do Alcides. Como consequência, foi implantado o acolhimento e classificação de risco na maternidade do hospital em março de 2016. Foram contratadas cinco enfermeiras obstétricas de fora, porque Petrópolis não dispunha de profissionais qualificados para o serviço", conta Leila.

Professor da FMP/Fase e coordenador do programa Rede Cegonha, em Petrópolis, Vander Guimarães lista outras vantagens que a abertura de vagas na Residência em Enfermagem Obstétrica trará para a Rede Cegonha, em Petrópolis e cidades vizinhas:

"Em 2017 foram realizados cerca de 3.500 partos de pacientes vinculadas ao SUS, em Petrópolis, através da maternidade do Alcides Carneiro. Embora seja um número expressivo, a cidade e a região carecem de uma cobertura mais ampliada de assistência ao pré-natal, bem como uma maior quantidade de leitos obstétricos para atender a esta demanda, que cresce anualmente. Qualificar profissionais que possam dar suporte à Rede, com melhor formação e que estejam capacitados para um acolhimento adequado, é investir na saúde das nossas futuras mamães e, por consequência, das nossas crianças”.

De acordo com o médico, além de poder ter mais profissionais na área de Enfermagem Obstétrica em uma região carente da especialidade, a residência proporcionará maior qualificação técnica dos profissionais, possibilidade de assistência multiprofissional para as gestantes e parturientes, em sintonia com as políticas públicas de Saúde da Mulher preconizados pelo Ministério da Saúde e com o cumprimento das normativas preconizadas pela Rede Cegonha na assistência materno-infantil.

"Uma das premissas da Rede Cegonha é oferecer às gestantes um pré-natal adequado e uma assistência ao parto de forma humanizada e segura. A capacitação proposta pela FMP/Fase contribuirá para trazer à cidade e região um profissional mais preparado para enfrentar esses desafios e com uma formação mais sólida para lidar com a saúde materno-infantil", ressalta Vander Guimarães.