terça-feira, 27 de agosto de 2019

Artigo: Último a sair apaga o fogo

Paulo K de Sá 
Médico e coordenador da Faculdade de Medicina de Petrópolis


Em tempos de avanço no desmatamento da Amazônia, uma das áreas mais importantes do planeta para a regulação do clima, biodiversidade e sobrevivência de inúmeras espécies, inclusive a nossa, assistimos a uma voraz investida sobre um dos maiores patrimônios da humanidade. Como se não bastasse, a Mata Atlântica e, principalmente, o Cerrado são devastados em meio à nuvem de fumaça na Amazônia.

Sabemos que o modelo econômico dita as decisões políticas, e seria ingenuidade não entendermos que a virada conservadora na política nacional e internacional levaria a esse quadro. Em nome do consumo e do crescimento ininterrupto, as corporações não irão se deter no avanço sobre os ecossistemas, transformando tudo em commodities.

No entanto, a divulgação dos cientistas de que dispomos somente de 12 anos para reverter radicalmente o quadro atual, para viabilizar a sobrevivência da maioria da humanidade e das espécies até o final do século, colocou em xeque tudo o que fazemos e escolhemos.

Não precisa ser gênio para entender que a mudança na dinâmica dos principais ecossistemas terrestres e marinhos provoca e provocará, cada vez mais intensamente, ondas de calor e frio, gerando a deterioração nas condições de vida. Toda essa mudança provoca efeitos previsíveis e imprevisíveis. Conhecemos pouco sobre os impactos que as mudanças causadas pela alteração nos ecossistemas poderão gerar, especialmente nos microrganismos, assim como na saúde de todos. Para além da degradação ambiental e do desconforto que a alteração climática provoca, em uma escala mais frequente os danos se tornam economicamente desastrosos por um lado e oportunidade para gananciosos do outro.

A alteração dos ecossistemas não se dá pura e simplesmente pelo desmatamento, mas também pelo abusivo uso de defensivos agrícolas, alterando a flora e a fauna e com importantes consequências em nossa saúde. Desde o início do ano foram autorizados no Brasil o uso de inúmeros agrotóxicos condenados em vários países. Tudo em nome da escala econômica e ampliação da fronteira agrícola para enfrentar a fome do mundo, promessa essa que sempre esteve como máxima convincente, mas que nunca foi cumprida pela dita revolução verde.

Em meio à destruição existem vários oportunistas que ganham dinheiro. Para alguns, a destruição é ótima oportunidade para lucrar com a reconstrução, redução de danos e medidas posteriores de minimização dos efeitos deletérios ocasionados pelos eventos climáticos.

Resta a pergunta: que tipo de humanos nos tornamos ao longo da história se o risco de desaparecimento como espécie for menos importante do que o controle mundial da economia e das oportunidades de ganho de capital? Parece que chegarmos ao final do século saudáveis ou não é menos relevante. O que interessa é como podemos ganhar dinheiro com o adoecimento e sofrimento em massa, em meio a ecossistemas deteriorados.

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Departamento de Comunicação Faculdade Arthur Sá Earp Neto/Faculdade de Medicina de Petrópolis