Se antes parecia pertencer a um futuro
distante, a medicina regenerativa hoje é estudada com interesse pelos futuros
profissionais de saúde. Conceitos básicos da tecnologia de manipulação de
células aplicadas em terapias, aspectos da biologia celular, controles de
qualidade de produção necessários à segurança do paciente e às
exigências legais para a infraestrutura laboratorial, incluindo as normas das
boas práticas de fabricação e de biossegurança, são pontos de estudos. Na
Faculdade de Medicina de Petrópolis (FMP/Fase), cresce o interesse em torno da
disciplina “Medicina regenerativa: manipulação in vitro de células para aplicações clínicas”.
“O estudo provavelmente fará parte da rotina dos
alunos de Medicina, Enfermagem, Odontologia e demais áreas de saúde, na medida
em que as evidências científicas e os aspectos regulatórios fundamentarem e
possibilitarem a utilização de células. Caberá ao futuro profissional entender
a fundamentação técnica científica para poder indicar ou acompanhar um
tratamento com a medicina regenerativa. Ela pode melhorar a qualidade de vida
dos pacientes e diminuir o custo social da medicina, particularmente nas
degenerações associadas ao envelhecimento”, diz Esther Takamori,
professora da disciplina eletiva da FMP/Fase.
Com 12 alunos de Enfermagem e Medicina, a
turma está concluindo o semestre. As aulas práticas acontecem nos laboratórios
do Centro de Medicina Regenerativa da faculdade (CMR), coordenado pelo pesquisador
Radovan Borojevic. Esther Takamori e Rosana Bizon Vieira Carias são professoras
e pesquisadoras do CMR. O material estudado pelos alunos é preparado
especificamente para o ensino, e não é utilizado nas pesquisas médicas que
ocorrem no CMR. O objetivo é fazer com que os alunos tenham esse primeiro
contato com a pesquisa em medicina regenerativa, e o interesse despertado para
a área.

“No laboratório, podemos ver como a manipulação
in vitro é um processo delicado, que
precisa de cautela e muito conhecimento. Quando estamos ali, nos sentimos parte
de um trabalho fantástico, vemos o processo científico de uma forma diferente e
podemos participar dele. O contato com a experiência foi esclarecedor, ao
abrir nosso campo de visão para uma área da medicina pouco divulgada e que já
apresenta um avanço grande. Não sei se no futuro trabalharei em um laboratório,
mas com certeza quero aprender mais sobre o assunto e incentivarei os meus
futuros pacientes a usufruírem desse ramo da medicina, que se mostra eficiente
e promissor”, completa a estudante de Medicina, Danielle Muniz.
Ela e os colegas acompanham situações-problema,
para identificar a melhor forma de tratamento a partir do caso clínico apresentado,
com base na aplicação de terapia celular e bioengenharia. Antes, viram como se
portar dentro do laboratório e a aplicar conceitos básicos de biossegurança.
Nada de acessórios, como bijuterias, e calçados abertos. Para entrar na área de
manipulação celular, é preciso vestir jaleco, luvas, protetores de calçados,
touca e máscara, além de seguir dez passos de higienização das mãos. Todo o
cuidado é para evitar a contaminação das células e das pessoas que as
manipulam, e para aprender como manusear e descartar os materiais biológicos. O
trabalho é minucioso: ao abrir e fechar cada garrafinha, por exemplo, não se
pode encostar, mesmo com luva, o dedo nos bocais.
“As aulas são muito boas. A teoria é dada
sempre de modo a esclarecer como funciona a célula e, através disso, explicar o
funcionamento do laboratório e o porquê das etapas e protocolos a serem
seguidos durante a manipulação celular. Então tudo está interligado, e faz
bastante sentido, o que desperta o interesse pela disciplina”, acrescenta a
estudante Danielle Muniz.
A professora Rosana Carias explica que nas
aulas teóricas há a fundamentação básica das tecnologias de manipulação e
cultivo de células humanas in vitro,
aplicadas tanto nos estudos de biologia e patologia celular humana, como no
preparo de produtos de terapias celulares avançadas: “Também são abordadas as
exigências legais para a captação de células e tecidos humanos para uso
científico ou clínico, e para a infraestrutura laboratorial necessária na
manipulação de células destinadas à terapia ou à pesquisa clínica.”
“A medicina regenerativa não é coisa do futuro. Estamos
vivendo isso. O potencial terapêutico já é amplo nas áreas de degeneração ou
trauma, no sistema musculoesquelético, incluindo a medicina da prática dos
esportes, e nos tecidos de recobrimento. Os resultados dependerão da extensão,
tamanho e localização das lesões, da idade do paciente, doenças pré-existentes
e condição sistêmica. A medicina regenerativa é individual. A indicação da
terapia e o seu sucesso dependem amplamente da formação e experiência do médico
e da qualidade de equipe. Vários estudos clínicos, obedecendo os critérios de
inclusão do paciente, já têm sido realizados na regeneração de tecidos como a
cartilagem, osso e pele, com resultados significantemente melhores do que
aqueles obtidos com as terapias convencionais”, ressalta Esther Takamori.
As professoras dizem que as possibilidades clínicas para o
uso da terapia em outras áreas do corpo avançam, junto com as pesquisas. Recentemente,
o grupo publicou um artigo científico sobre o tratamento de reabsorções na articulação
temporomandibular, associadas a deformidades dentofaciais, com a utilização de
células obtidas da cartilagem do septo nasal, junto com Karla Menezes e Ricardo
Tesch, também professores da FMP/Fase.